INFORMATIVO

03/06/2020 Embolizaçao arterial uterina para tratamento de miomas. Experiência preliminar do hospital Semper

RESUMO

A embolização arterial uterina (EAU) para tratamento de miomas através do cateterismo seletivo das artérias uterinas tem-se estabelecido como uma opção eficaz, segura e minimamente invasiva. Neste artigo, fazemos revisão bibliográfica sobre o assunto no período compreendido entre 1994 e 2003, tomando como base o banco de dados da LILACS/BIREME, e apresentamos a experiência preliminar inicial do Serviço de Hemodinâmica do Hospital Semper em Belo Horizonte.

A Viamed é uma empresa especializada no tratamento e embolização de miomas.

SAIBA TUDO SOBRE MIOMA

INTRODUÇÃO

Leiomiomatose é a proliferação benigna de células musculares lisas e do tecido conectivo do útero. Ela pode ser única ou múltipla e varia em tamanho de 1 mm a mais de 20cm de diâmetro, envolvida por pseudo-cápsula de fibras musculares comprimidas. Miomas uterinos são a neoplasia mais comum da pelve feminina e ocorrem em 20% a 25% das mulheres em idade reprodutiva. Constituem a indicação mais freqüente de histerectomia, sendo estimado que, nos Estados Unidos, são realizados anualmente 175 mil histerectomias por ano para tratamento de miomas, ao custo de um bilhão de dólares1,2.

HISTÓRICO

A embolização arterial uterina foi primeiramente usada para controlar hemorragia pós-parto. A técnica foi descrita em 1979 por Heasten et al.3 Embora seja terapêutica eficaz e segura nesta situação, inexplicavelmente não se estabeleceu como tratamento rotineiro para hemorragias puerperais. Em 1995, Ravina et al5 observaram redução dos volumes de miomas de pacientes submetidas à embolização arterial, especificamente para tratar miomas uterinos6. Desde então, esta modalidade terapêutica se espalhou pelo mundo, estimando-se que mais de 60.000 casos já tenham sido realizados com sucesso7.

SELEÇÃO DE PACIENTES

Por serem tumores benignos que involuem com a menopausa, apenas os miomas que produzem sintomas devem ser tratados. O sintoma mais freqüente é o sangramento anormal que comumente se manifesta como sangramento mesntrual abundante, tendo como conseqüências a anemia e a exacerbação das cólicas menstruais devido à eliminação de grandes coágulos. As outras manifestações provocadas por miomas são todas relacionadas a efeito de massa, podendo causar sintomas urinários, intestinais ou neurológicos, dependendo da estrutura que comprimem. Freqüentemente tem sido sugerido que infertilidade pode ser causada por miomas. Após a miomectomia, preservando o útero, 40% a 60% dessas mulheres conseguiram engravidar. Corroborando este achado, Ravina et al relataram 12 casos de gravidez após embolização de miomas8.

A indicação de tratamento para miomas é feita pelo ginecologista e cabe a ele colocar a opção da embolização ao lado dos tratamentos tradicionais: histerectomia e miomectomia laparoscópica. Miomas submucosos pedunculados com diâmetros menores que 4cm são facilmente ressecáveis por histeroscopia. Miomas subserosos grandes e pedunculados são geralmente encaminhados para miomectomia laparoscópica. Úteros muito volumosos (maiores que 22cm de diâmetro longitudinal) devem ser abordados por histerectomia. As contra-indicações consistem em alergia a meios de contraste, infecção pélvica em atividade, massa pélvica não diagnosticada e carcinoma endometrial.

TÉCNICA

A paciente é sedada com Midazolan e Fentanila, com a assistência de anestesiologista. O acesso vascular é feito pela técnica de Seldinger, com a colocação de um introdutor 4F ou 5F na Artéria Femoral Direita. Um cateter Cobra ou Robert (este último desenhado com alça especificamente para cateterizar as artérias uterinas) é manipulado até a aorta abdominal, onde realizam-se estudos angiográficos de aorta e ilíacas, a fim de se visualizar as matérias uterinas E e D (facilmente identificáveis pelo seu trajeto em forma de sacarolhas). Com o auxílio de um fio-guia hidrofílico 0,035, cateteriza-se seletivamente a artéria uterina E e injeta-se partículas de Polivinil-álcool (PVA) 300-500 micras diluídas em soro fisiológico e meio de contraste, até que a constrastação dos miomas à fluoroscopia desapareça. O cateter é, então, manipulado com alça de Waltman e dirigido até a artéria uterina direita onde o mesmo processo é repetido. Após a embolização, cateter e introdutor são retirados e feita hemostasia compressiva no local da punção. A paciente é encaminhada para seu quarto, com acompanhamento das clínicas anestesiológica e ginecológica. Mais recentemente houve relatos de embolizações eficazes com uso de tris-acry l microsferas embebidas em gelatina (Embospheres )9-15. Já aprovadas pelo Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos para embolização de tumores hipervascularizados, as microsferas são compre ensíveis e, portanto , mais fáceis de serem liberadas por meio de microcateteres , mesmo se o calibre do cateter for menor que o diâmetro delas. Esta característica previne o entupimento do cateter pelas partículas.

CUIDADOS PÓS-EMBOLIZAÇÃO

Dor após o procedimento ocorre em 100% das pacientes e é o que determina a internação hospitalar por período médio de 24 horas. Ela é variável, podendo ceder com acetaminofen em algumas pacientes, mas podendo ser comparada à dor do parto por outras, exigindo a administração de analgésicos potentes, com o concurso da clínica de dor. Felizmente o processo álgico cede rapidamente durante as próximas 24 horas, na maioria das mulheres. Quando acompanhada de febre, náuseas, vômitos e leucocitose, caracteriza a síndrome pós-embolização, que normalmente cede em uma semana, mas exige o acompanhamento de perto pela equipe (hemodinamicista, ginecologista e clínico de dor). Em pequeno número de pacientes, a síndrome pósembolização pode ser mais grave, com febre acima de 39º C e leucocitose além de 20.000/mm3 . Se a paciente desenvolve sintomas associados, como corrimento vaginal e, especialmente, se a febre, dor e indisposição são progressivos, antibióticos e hidratação são recomendados16 . Sintomas gastrointestinais como diarréia, vômitos e dor abdominal, após um período assintomático, podem ser indicativos de complicações sépticas16-18.

RESULTADOS

O mais importante fator de sucesso clínico é a habilidade para realizar embolização arterial uterina bilateralmente. Este sucesso técnico em todos os relatos varia de 94% a 98%. A resolução da menorragia tem oscilado entre 86% e 96% 19, 20 e o controle da dor é atingido em 90% dos pacientes. Setenta a oitenta porcento das mesmas apresentam melhora dos sintomas relacionados a efeitos de massa. A redução do volume uterino mediano é de 34% em três a seis meses,a tingindo 40% em um ano. A redução do volume mediano do mioma dominante foi de 48% em seis meses e 78% em um ano. Portanto, embora o alívio dos sintomas seja notado já no primeiro ciclo menstrual, as alterações volumétricas à ulta-sonografia e à ressonância nagnética só serão detectadas após o terceiro mês da embolização.

COMPLICAÇÕES

A melhora dos sintomas e a redução volumétrica dos miomas é resultado da isquemia provocada pela interrupção do fluxo arterial uterino. Este insulto isquêmico agudo ao útero manifesta-se por dor intensa que exige o uso de analgésicos potentes nas primeiras 12 a 18 horas21. Quatro a oito porcento destas pacientes permanecem internadas por mais de 24 horas ou exigem reinternação quando já receberam alta. Estes casos de dor persistente, geralmente são acompanhados de náuseas, vômitos, febre e leucocitose e caracterizam a síndrome pós-embolização. Regride espontaneamente em uma semana, necessitando apenas tratamento sintomático. Um por cento das pacientes necessita histerectomia, por falência do tratamento ou por complicações sépticas 16-18. Após a embolização, 1,8% a 9% das mulheres vão apresentar sintomas de menopausa, incluindo amenorréia 7,20. Isto é significativamente mais provável em mulheres com idade acima de 45 anos, e especula-se que tenha relação com a vascularização ovariana que é progressivamente reduzida com a idade 22,23. Outras complicações incluem corrimento vaginal na primeira semana e expulsão de miomas ou fragmentos de miomas, especialmente quando há miomas submucosos24. Três casos de morte por sepitcemia pós-embolização foram relatados16,18. Os achados de autópsia em duas destas pacientes mostraram lesão isquêmica mais extensa do que o desejado17,18. Por esta razão, o uso de partículas de PVA menores que 300 a 700 mm, para reduzir o risco de complicações isquêmicas11. Com o mesmo objetivo, em lugar da oclusão total das artérias uterinas, o desaparecimento da hipervascularização relacionada aos miomas, com redução do fluxo distal, mas com patência da artéria uterina principal, incluindo ramos cérvico-vaginais minimizará a extensão da embolização do leito arterial uterino. Estudos recentes que utilizaram esta técnica, tanto PVA como com microsferas mostraram sua segurança e eficácia15,25. As complicações vasculares decorrentes da punção femoral para acesso vascular são raras, uma vez que o calibre dos cateteres é muito pequeno (4F ou 5F), e as pacientes não utilizam medicamentos que interferem com a coagulação.

PROFISSIONAIS QUE DEVERIAM EXECUTAR O PROCEDIMENTO

A terapia endovascular é exercida por cardiologistas e radiologistas intervencionistas. Historicamente, no Brasil, por necessidade dos hospitais e pelas disponibilidade dos serviços de hemodinâmica, o cardiologista intervencionista se tornou pioneiro nos tratamentos endovasculares extra-cardíacos. Após quatro anos de residência em clínica médica e cardiologia, o residente de hemodinâmica e cardiologia intervencionista inicia seu treinamento, desenvolvendo a técnica de dissecção e punção para acessos vasculares. Em seguida, vem o chamado cateterismo direito, onde um cateter é inserido em veia um periférica e manipulado até as câmaras cardíacas direitas e leito vascular pulmonar para registro manométrico. A terceira etapa é a do cateterismo esquerdo ou arterial, no qual o residente realiza arteriografias de membros e de vasos supra-aórticos, cineangiocoronariografia e intervenções terapêuticas endovasculares extra-cardíacas, como angioplastias periféricas e embolizações de tumores e malformações de artério-venosas. O terceiro ano é totalmente dedicado às terapias endovasculares, incluindo angioplastias periféricas e embolizações e quimioembolizações, entre outras. Portanto, apesar do título de cardiologista (por ser a Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista vinvulada à Sociedade Brasileira de Cardiologia), o “hemodinamicista” é um profissional habilitado e familiarizado com as diversas técnicas de cateterismo em todos os sistemas. Alcançar as artérias uterinas é questão de habilidade em manipular os cateteres, uma vez que o acesso vascular é o mesmo para os demais cateterismos e a anatomia vascular é bem conhecida pelo cardiologista intervencionista.

RESULTADOS

Sucesso técnico, definido como embolização arterial uterina seletiva, bilateral, foi alcançado em 100% das pacientes. Das 17 pacientes com fluxo menstrual aumentado, 16 relataram redução do fluxo, enquanto uma não notou alteração. Os sintomas de dor pélvica e compressão de intestino e bexiga desapareceram em todas as pacientes. Os níveis de hemoglobina subiram para 12,2 a 14,1 g/dl. Uma paciente que recebeu alta na manhã seguinte ao procedimento teve que ser readmitida por mais 24 horas por apresentar dor abdominal que não cedeu com a medicação oral. Uma segunda paciente que apresentou febre por mais de três dias, recebeu antibioticoterapia empírica por uma semana. Não houve complicações maiores.

CONCLUSÃO

Embolização arterial uterina com partículas, um novo tratamento minimamente invasivo para miomas uterinos constitui alternativa segura e eficaz à histerectomia e à miomectomia. Pacientes experimentaram alívio de seus sintomas com um mínimo de efeitos colaterais, comparados aos da histerectomia e miomectomia. A não recorrência dos miomas também favorece o futuro desta técnica. A aptidão para retornar rapidamente ao trabalho e a ausência de cicatrizes cirúrgicas e emocionais são importantes para as pacientes.

http://rmmg.org/artigo/detalhes/1351

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